quinta-feira, 18 de março de 2010

Gilles Deleuze


Antes de Deleuze, confesso, não acreditava que a filosofia fosse possível. De fato, na escola, na faculdade e nos livros enxergava apenas a beleza austera dos conceitos, a intempestividade dos sistemas de problematização e explicação do mundo sem, no entanto, vê-los tangíveis. Amava a filosofia, sim. Todavia ela sempre me parecia dissociada do mundo orgânico, molecular, cotidiano, trivial. Desejava possuir conceitos, senti-los à palma da mão, numa tangicidade transcendente. Brandar a todos que a filosofia, embora conceitual, nutria-se da cotidianidade da vida. Angustiava-me a figura clássica do filosofo. Intelectos privilegiados pela natureza, condenados, naturalmente, à raridade. Este ideal schopenheureano incidia-me um tão profundo senso de estagnação intelectual que eu enxergava a filosofia quase que por uma razão messiânica. Nietzsche já havia me ensinado a tragicidade positiva da vida, que ela só se justifica, afinal, como senso estético. Sartre me mostrou o peso da liberdade, que sou um homem sem desculpas, que é preciso, pois, o engajamento fundamental da vida. Mas com Deleuze aprendi a acreditar na criação filosófica. Ele mostrou-me, com beleza e ordem conceitual, que a filosofia é uma questão de vida; pois também de morte. Para Deleuze, o filosofo é um inventor. Sim, um criador de conceitos. Os conceitos são instâncias de vida. Assim, toda a filosofia de Deleuze é um brado à criação não propriamente de conceitos, mas, em suma, da própria vida. A vida gestada no que há de mais trivial, urgente, íngrime, cotidiano. Afinal, é nas cidades e nas ruas, nos guetos, nos bancos públicos, nas manifestações de massa, nas veredas que a filosofia está constantemente sendo elaborada, criada, gestada. Quero uma filosofia orgânica, sentida, no significado e no significante, que me faça saber que, no fim, não posso fugir da vida.

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