quinta-feira, 1 de abril de 2010

Deus está morto?


Me parece uma arrogância ingênua das ciências humanas proclamar, hoje, a morte de Deus e a obsolência da religião, sobretudo no Brasil. O que percebo, nos diversos seguimentos políticos e culturais, é ainda a deflagrada influência da religião sobre os fatos sociais. Por isso creio que a constatação da obsolência da religião nas sociedades modernas tornou-se, por fim, um lugar-comum das ciências humanas. Os intelectuais brasileiros – e principalmente os europeus – habituaram-se ao comodismo das suposições teóricas que postulam Deus como um dado superado nas circunstâncias sociais e políticas do homem de hoje. Deus não é mais uma questão passível de análise e questionamento visto o fato constatável de sua decadência e seu esquecimento no mundo do capitalismo avançado. Há, portanto, hoje, por parte dos filósofos, um certo silêncio, uma espécie de indiferença confessada com a questão de Deus. Deus tornou-se um saudoso artefato folclórico. Há, evidentemente, razões históricas para isso. A modernidade Ocidental nasceu sob a égide do secular. A ciência experimental questionava a teologia. Copérnico e Galileu contra Aristóteles e Ptolomeu. Descartes contra a Escolástica. O subjetivismo secular da modernidade contra o holismo cristão da Idade Média. Por certo o sujeito secular e a ciência experimental são noções caras à religião e, em especial, ao cristianismo. Os Iluministas postulavam a supremacia da ciência, da razão e da política como orientadoras das ações humanas no mundo. No século XIX, Feuerbach antropoligizou a teologia. Deus, na verdade, é um dado humano. Nietzsche proclamou a morte de Deus, a superação da moral platônico-cristã. Marx afirmou a superação da religião como conseqüência lógica da superação da histórica dicotomia de classe. De certo modo, o que perdura, hoje, sobre a problemática de Deus, segue essas postulações. O irônico é que os ateus ingênuos usam essas postulações quase que como credos, incontestáveis, indiscutíveis... Dogmas às avessas! Deus está morto? A religião tornou-se mesmo algo caduco? Folclórico? O homem contemporâneo é realmente secular? O Brasil é um país que desconsidera a questão de Deus? Creio que não. Não julgo que as postulações de Marx, Nietzsche e Freud sejam, ao todo, irreais. O que considero é que as circunstâncias históricas mudaram. Hoje, a religião mudou, assumiu outra roupagem, outros modos de atuação no social, outras características de dominação do imaginário – embora, ontologicamente, os fundamentos permaneçam os mesmos. Todo o social contemporâneo brasileiro é permeado da influencia da religião sobre os acontecimentos na política, na moral, na estética, na ciência. Os embates das pesquisas das células-tronco, a polêmica da liberação do aborto, o casamento homossexual, a clonagem de seres vivos, os confrontos éticos e políticos no oriente médio, são algumas questões irresolutas que demonstram o peso da religião como propulsora das questões sociais no Brasil e no mundo. Todos os ataques terroristas são justificados segundo a mórbida lógica maniqueísta do bem contra as forças do mal. Da religião verdadeira e santa, contra os hereges. No caso do Brasil, a religiosidade ainda é imensamente imperante no imaginário social. Padres, pastores, cantores cristãos, são verdadeiros ícones da cultura pop. Há um crescimento considerável de vertentes espirituais não-cristãs como o Budismo e o Islamismo. Mas o Cristianismo ainda monopoliza o cenário de influência. E o que é pior, o seguimento que mais cresce no Brasil é o neopentecostalismo. Fundamentalistas, fideístas, os neopentecostais assumem grande parte do cristianismo atuante no Brasil. Por certo a mídia é o grande instrumento de influência e dominação das igrejas neopentecostais e, também, católicas. A Igreja Universal do Reino de Deus, de Edir Macedo; a Igreja Internacional da Graça de Deus, de R.R. Soares; a Igreja Renascer em Cristo, de Estevam Hernades e, agora, o novo fenômeno do fideísmo no Brasil, a Igreja Mundial do Poder de Deus, de Valdomiro Santiago, constituem verdadeiros fenômenos de religiosidade cristã. Prometendo milagres, curas, prosperidade financeira e até ressurreição, essas igrejas configuram-se em verdadeiros impérios econômicos. É indubitável a influencia da igreja cristã – católica ou protestante – nas resoluções do Estado no Brasil. Nossa moral não é, e jamais foi, uma moral laica. O ateu ainda representa, no imaginário brasileiro, o homem sem valores, descrente, sem esperanças. Assim, diante de excessivas evidências, há mesmo como supor a morte de Deus? Há mesmo como postular a obsolência da religião? Há muito desconfiei que a morte de Deus e a obsolência da religião são fatos constatáveis apenas para filósofos, sociólogos, cientistas sociais. Para o povo, a massa, a coletividade, Deus está vivo, atuante. E segue, ativamente, sua lógica da influência, da interferência no mundo humano. Sim, Deus não está morto. A religião é a mais atual das forças ancestrais do imaginário humano. Assim, creio que torna-se necessário um ateísmo crítico, engajado, militante, que considere a urgência de uma nova análise do fenômeno religioso na sociedade contemporânea.

13 comentários:

  1. Bem me corriga se eu estiver errada nesse texto vc afirmou a sua duvida em relaçao a existencia de Deus e ainda criticou as igrejas nao so a Catolica como tbem a Protestante.Como vc mesmo me falou vc e um pesquisador entao por q naum me fala dos resultados dessas pesquisas q fizeram vc ter uma visao tao antiquada de q ainda somos controlados pelo poder da igreja e q essa igreja ainda despreza os ateus.Eu so quero entender a sua visao sobre religiao para q eu possa concretizar a minha.Pois pelo q eu posso ver sao bem diferentes .Bom e so isso.
    Otimo blog Renato
    bjus

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  2. A inteção do texto, Luana, é demonstrar que, ao contrário do que as ciências humanas postulam, nao há, na sociedade contemporânea, a obsolência da religião nem a morte de Deus. O que afirmo é que é determinante ainda a influência da religiao sobre os assuntos políticos e culturais. A religião ainda domina, sim, as resoluções do Estado e o social civil. Esta posição, Luana, nao é antiquda. Onde ha religião há, de modo geral, alguma forma de dominção. Ocorre, porém, que a dominação que a religião exerce hoje é mais complexa. Sobretudo por abusarem dos meios midáticos. A religiao tornou-se um mercado, com intenso interesse economico e político (na verdade, sempre foi assim). Isso é tão empírico que o imaginário popular ainda pensa o ateu como alguem sem valores, amoral, sem ética, incapaz de bondade. O que devemos entender é que a bondade, a ética, a moral, a piedade, independem de qualquer religião e que, portanto, é possível construir um mundo humano, justo e bom, sem a religião.

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  3. Concordo com vc que Deus ainda esteja vivo no imaginário do povo brasileiro,principalmente os mais pobres,pois,assim podem manter sua dignidade perante a precariedade em que vive.E se a classe dominante também esta no mesmo barco é pq encontrou uma ótima fonte de "pesca" para que suas iscas atraia o maior numero de peixes possíveis,pois,nesse oceano de miséias,desespero e solidão não faltam ondas para entrar...
    Muito embora, acredito eu ,que a dominação no fundo,não provém da religião e sim do capital.E que a religão para o bem ou para mal tb é dominada,não quero dizer com isso que ela é ingênua e que seja uma vítima,mas que agrupou a sua "ética" novos valores,que por sinal não tem valor algum...
    Estava conversando a um tempo atrás com um homem,que ao meu ver é bastante sábio e perguntei a ele exatamente isso,se o homem não seria capaz de viver sem a existência de Deus,se era possivel um mundo bom e justo se o homen adquirisse consciência,que o bem e o mal estava na verdade dentro dele,que era seu proprio Deus e o Demônio.E que pra sua propria sobrevivência haveria de construir uma ética bastante forte a respeito do respeito,demarcando a liberdade do outro onde a sua termina.Ele me respondeu,que sim,que era bem possivel,que esse mundo sobrevivece,porém a superelevelaçao desse homem a deus,tornaria esse mundo egoista.Se o homem subexiste por si mesmo não há pq a existência dos outros(no sentindo interior)e assim dificilmente descobriria o amor,pois ,o amor é o fruto da dor,da ausência. Sendo que o amor não surge da compreenção,mas da compaixão.E terminou,"volto a dizer, poderia sim sobreviver,mas não viver,pq não há vida digna sem amor...

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  4. Pensei,procurei respostas,mas ainda não encontrei...

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  5. liiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiindo!Amei esse texto!o foi uma das coisa mas liindas q eu já li!E entendi se u ponto de vista eu acho.
    A religião é algo que tem q partir de nós ér a nossa bondade e não a nossa ignorância contra os ateus ou 5 a dez reais q doamos a igreja e que a religião não morreu e sim está se manifestando de maneira diferente de antigamente e consequentemente de maneira mais complexo.Se deus é santo e existente ele da apenas um único sinal e resta a nós compreendê-lo e uma vez compeendido ele jamais pode ser confundido com outros sinais e tb jamais será esquecido.Acertei?????

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  6. Flávio, um mundo sem religião não significaria, necessariamente, um mundo cujos valores fossem sustentdos apenas pelo egoísmo, quer dizer, é um erro supor que a religião seja a única Instância de refência de valores absolutos. Kant, no século XVIII, com seu imperativo categórico que postula a universalidade moral das açoes humanas, mostrava que a moral pode ser fruto de uma construçao racional. É evidente, porém, que um mundo sem Deus é um mundo de aparente relativismo visto o fato de nao existir um refencial absoluto para nossas ações. Há muito a filosofia contemporânea busca fundamentar uma ética abstraída da transcendencia religiosa. Um homem sem Deus nao é propriamente um homem egoísta e mau, sem valores humanos e fundamentais. A bondade, repito, independe de Deus.

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  7. Renato,em nenhum momento escrevi a palavra religão,no instante em que falava unicamente das proposições a respeito da importância ou não de Deus. De fato,penso eu,que necessariamente,a crença da existência de Deus não dependa inteiramentere ou completamente da religião,pois,essa não é mais do que uma instituição,que se apropria da crença universal para patentiar a fé. Criando assim suas "patentes espirituais", mas não é assim com qualquer ocupação humana?
    Até mesmo na filosofia, onde seus adeptos valorizam mais o acadêmico do que um mendigo,muito embora,esse possua um pensamento muito mais vivo,novo,cortante e singular do que aquele que segue os preceitos dos "ismos" e que no final não deixa de ser uma cópia daqueles que admira.
    Para o homem sobreviver não basta apenas a bondade, talvez eu mataria por um prato de comida!
    Isso vai muito além do bem e do mal,são forças misteriosas que a consciência humana
    não domina,e talvez nunca domine...E o pensamento ou qualquer ação que deriva do pensamento não tem qualquer justificativa pela razão, a catalisadora de qualquer destruição e salvação que banha o mundo é decorrente da mão. A mão é culpada de lançar a bomba atômica,de aperta um butão que libere um gás mortal,de apunhalar o outro quando pensa na revolução ,como tb a mão é capaz de levantar-te quando estiveres caindo, de apertar tuas cálidas pernas quando assim tens medo,de seguir juntos,numa mesma direção...
    Imagine se os outros seres estivessem mãos? Imagina o ódio acumulado dos cães ou das aves contra esses imbecis mortais? Que são os únicos que não respeitam a propria natureza e destroi as demais,que prende-se numa jaula e acorrenta-o na grade.
    Ai sim,se um dia,por um milagre, os animais tivessem mãos, quem sabe após o banho de sague, a natureza humana fosse compreendida e todos vivessem em paz!!!

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  8. Estou de acordo com você, Flávio, quando diz que a espiritualidade(Deus)independe de religião, e que as religiões criam "patentes para a fé". Também concordo que a academia tem também seus fundamentalismos. Ocorre, entretanto, que ainda continuo defendendo uma base racional para a fundamentaçao dos atos morais e, por isso, nego a religião como instância única de legitimação da ética. Quando digo bondade, quero dizer que o homem é capaz de valor moral, capaz de ser ético sem ser religioso.

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  9. Querido Renato, cada vez te acho mais lúcido.Por exemplo:para mim deus esta morto como eu havia imaginado ou como haviam me ensinado.Mas sem dúvida percebe-se o quando a idéia ou a crença em deus dita a moral social, política e etc, só não vê quem não quer.Também se pretende matar o capitalismo e da mesma forma será difícil, pois, para mim tanto um como outro são como que vírus mutantes e portanto vão se adaptando e transformando e continuam a dar a ordens desde mundo onde deus e o capital estão cada vez mais de braços dados.Depois falaremos mas sobre este assunto.
    Laura Lobato.

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  10. Bem como não pretendo ser racinal a todo instante,e a razão ser um dos instrumentos que utilizo para para compreender o que estar a minha volta,até mesmo a própria razão.Então não há razão para eu credibilizar unicamente a ela,senão torna-se fanatismo,ai o abismo está aberto...

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  11. Pra finalizar,acho q a morte de Deus se dá justamente por esses "fanáticos da fé",que não tem nada haver com o homem religioso,que se conta nos dedos.Digo isso não sendo um homem religioso,pois não amaria qualquer inteligência que fosse capaz de cria o homem,por mais que eu admire a inteligência!

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  12. Oiii amigo de longas datas..Aqui estou, dando também o ar da graça em seu blog... Por sinal, gostei muito da idéia e da estética....sem desprezar é claro, o conteúdo....
    Este texto por sinal, me chamou a atenção..
    Fico admirada em ver o quanto o homem se esforça para NEGAR a existência de Deus...Esforços esses, inúteis, pois Deus é o princípio e o Fim de tudo...Ele sempre existiu, e todas as outras coisas subsistiram por Ele e para Ele...
    Acreditar que todo este universo que funciona tão PERFEITAMENTE, assim como o HOMEM e sua infinita complexidade, surgiu de uma grande explosão seria o mesmo que acreditar que "se eu cortasse milhares de letrinhas do alfabeto e jogasse tudo no ar e de repente elas seriam capazes de cair todas em uma ORDEM PERFEITA e formar o mais belo conto já existente...."
    Em fim...concordo em gênero, número e grau com vc, que a religião tem se tornado um fiasco para sociedade, isso me entristece profundamente... a mídia, a briga por poder, a teologia da prosperidade tudo isso me da naúseas...sabe pq??? Pq eu conheço um DEUS que está além disso tudo...Eu conheço um DEUS que é mais real do que EU e VC!! EU O CONHEÇO não por ouvir falar, Não por LER a respeito, ou por qualquer outra forma...EU O CONHEÇO por um relacionamento ÍNTIMO, que durante toda a minha vida NUNCA havia experimentado...E sabe de uma coisa??? com os olhos CARNAIS, jamais conheceremos aquele que é ESPIRITO....

    Beijooooooo pra vc!!!!!!!!

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  13. Renato...meio confuso esse texto, eu me PERGUNTO o porquê? e nâo encontro RESPOSTAS..Enfim as respostas são complexas de cada um, então cada um tem uma resposta e ánalisa diferente do que significa DEUS....Algumas pessoas acham que por alcançar um milagre foi o DEUS que o ajudou.. e só procura se comunicar com DEUS quando estar precisando de alguma coisa.então é da religião mesmo....
    Adorei essa pergunta...

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