sábado, 17 de setembro de 2011

CÉTICA





Viu a chaga do teu semelhante?
Olha, olha um pouco
vê as barbas dos desvalidos
as lidas dos idosos
vê as rugas dos octogenários
o cansaço dos centenários.

Não passaram sobre eles o tórrido moinho da vida?

Os vegetais apodrecidos
as cadeiras gastas, as molas inválidas, os cactos murchos

Olha, vê como passaram sobre eles
o tórrido moinho da vida.

Enxerga o ônibus perdido
o gelo derretido, o tecido puído, o beijo insentido
você viu aquele desconhecido?

Neles todos o tórrido moinho da vida.

Não percebes as raivas desfeitas?
os orgulhos ilegítimos, as desculpas falhas,
não? Não percebes como o pêlo cai?
como o dente careia? Como a saliva seca?

Olha, vê como são breves os medos
o salário, o afago, o sexo, vê?
A prece? A prece é curta
raso todo culto
Deus? Onde?

Ali, olha, par de chinelos esquecido
mortalha posta, alimento azedo, resíduos
restos de coisas em desuso

Não terá sido tudo levado
pelo tórrido moinho da vida?

Não?